03 novembro 2006

Fanado di mindjer* - A Questão da Mutilação Genital Feminina



* Expressão guineense que traduz a excisão feminina e todas as cerimónias tradicionais associadas

A Mutilação Genital Feminina (MGF) é uma prática de carácter cultural que assinala a passagem para a idade adulta e consiste na remoção do clítoris e, muitas vezes também, dos lábios vaginais. Esta prática, frequente em determinadas culturas de África, da Península Arábica e da Ásia (e depois perpetuada na Europa e na América do Norte através das comunidades emigrantes), ocorre entre muçulmanos, cristãos, animistas e judeus, apesar de nenhuma religião o exigir. Emerge de uma tradição em que os órgãos genitais femininos são considerados impuros e em que se acredita que só os homens devem ter prazer sexual, que esta prática melhora a fertilidade, desencoraja à promiscuidade e aumenta a probabilidade da futura mulher se vir a casar.
Esta prática é, na maioria dos casos, encorajada pelos pais das raparigas que as submetem a uma “cirurgia”, sem qualquer anestesia, nem cuidados de higiene, através de instrumentos não esterilizados e de utilização invulgar, como facas, pedaços de vidro e gillettes. Para além de danos físicos por vezes irreversíveis (muitas destas cirurgias acabam na morte das raparigas por falta de higiene no processo de cicatrização e, obviamente, pelo tipo de instrumentos utilizados para a remoção dos órgãos), a MGF leva também a danos psicológicos profundos porque é algo que não acaba com a “cirurgia” mas que afectará as raparigas permanentemente enquanto Mulheres (por exemplo, destituídas do símbolo da sua feminilidade, o acto sexual será um acto de mera subserviência, para além das dores que causa; no momento do parto, as dores são maiores tal como a perda de sangue e o risco de infecções,…).
Esta prática tem vindo, cada vez mais, a ser contestada pela comunidade internacional, vista como um atentado aos Direitos Humanos mas, sobretudo, aos direitos das crianças que sofrem terrivelmente por uma tradição que condicionará as suas vidas em diversos aspectos e que se considera necessária para que sejam aceites pela sociedade envolvente e para honra da família.
Há uma série de dinâmicas sociais que têm de ser avaliadas antes de se proceder a qualquer tentativa de eliminação desta prática e isso exige maior esforço dos governos e da sociedade civil, de modo a compatibilizar valores culturais ancestrais e totalmente enraizados, com a importância de preservar a dignidade e direitos destas raparigas (mais de 135 milhões de mulheres e raparigas têm sido sujeitas à mutilação genital em todo o mundo) e integrando neste processo os chefes tradicionais e religiosos, os curandeiros, a comunidade, os profissionais de saúde e professores com o objectivo de desencorajar à prática.

http://dossiers.publico.pt/dossier.asp?id=967
http://www.cpihts.com/MGF/1_parte.htm
http://www.who.int/reproductive-health/fgm/index.html

2 Comments:

At 7:41 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Infelizmente, este drama, acontece também no nosso país.

 
At 10:16 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Sim, obviamente - as tradições e costumes migram com as pessoas. Na respectiva literatura, sublinha-se o conflicto psicológico ainda mais grave nestes casos, uma vez que as raparigas vivem num ambiente diferente nos espaços públicos das sociedades do Norte Global (em termos de democracia, igualdade, participação, direitos humanos,...), mas dentro da familia são confrontadas com estas estruturas tradicionais e repressivas. Um cruzamento perverso desta polaridade é a realização da operação num ambiente médico, o que diminui os riscos imediatos (mas não os de longo prazo!) de saúde - mas não muda nada quanto à violação dos direitos humanos!

Um outro aspecto que gostaria acrescentar é relativo ao HIV/SIDA. Esta pandemia espalha-se ainda mais rapidamente através desta prática, muitas vezes efectuada num ritual colectivo com a mesma ferramenta para mais do que uma rapariga.

A coisa mais importante, me parece, é informação e sensibilização de todas as partes involvidas!

 

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